segunda-feira, 9 de setembro de 2013

O Reino e a Bruxa

Eu gostaria que você mande seus contos,suas ilustrações, e até videos que conte alguma historia para carlosgall2003@yahoo.com.br, e eu colocarei aqui, como fiz com este conto.

Autor:Pedro Henrique

O chão úmido da caverna fazia com que as passadas do Cavaleiro fossem barulhentas. Para caçar uma bruxa deve-se ser mais silencioso que uma formiga, dissera-lhe o Conselheiro. Com espada em punho o Cavaleiro ia se esgueirando, se apoiando nas paredes para evitar que escorregar-se. Você é o único que pode nos proteger, ó nobre Cavaleiro, eles disseram, Vá e mate a terrível bruxa que nos atormenta.

A bruxa que fazia a vida dos camponeses um império de medos surgira há muitos anos. Era apenas uma lenda que perdurava desde o tempo dos Antigos Reis. Por muito tempo ela ficou sumida do mundo, provavelmente planejando a sua volta por anos. Era assim que pensava o Cavaleiro. Ele não poderia deixar que tal mal prejudicassem as pessoas que ele jurara proteger.

Rebanhos inteiros haviam sumidos, crianças sendo atraídos para as partes mais sombrias das florestas, estoques de carne sendo roubados sem nenhum vestígio deixado. Alguns diziam até que ela espalhara uma doença mortal sobre algumas aldeias. O Cavaleiro ferveu de raiva quando soube que a bruxa voltara a atacar com tanta frequência, depois de alguns anos de aparecimentos esporádicos. O estopim para fazer o Rei mandar o Cavaleiro foi o desaparecimento de uma garotinha, que demorou 3 dias até voltar para casa.

- Você é o único dentre meus cavaleiros que tem coragem de enfrentar uma bruxa – disse o Rei.

Agora ali, naquela caverna úmida e fria, o Cavaleiro sentia pouco medo. Ele não sabia se era medo ou apreensão. Mesmo assim ele seguia andando sem rumo pela caverna e não pararia até encontrar a bruxa.

Depois de algum tempo andando sem nenhuma luz para iluminar o caminho, o Cavaleiro avistou um reflexo. No final do corredor onde estava havia uma curva, e uma luz refletia na parede molhada. Agora com mais cuidado ainda ele se agachou e ficou preparado para o golpe final na bruxa. Olhou para a sala em que a curva dava, e viu a bruxa. Ela estava sentada numa pequena elevação de pedra da caverna. Vestia trapos negros, era magra e o cabelo estava todo desgrenhado. Havia lixo de todo tipo em sua volta, pedaços de ossos, roupas rasgadas, animais mortos. Todo o ambiente fedia.

- Eu já sei que você esta aí – o Cavaleiro ouviu a bruxa dizer.

Sem hesitar, o Cavaleiro partiu numa corrida de fúria em direção à bruxa, preparando um golpe de espada. Ele estancou quando a ouviu gritar:

- PARE AÍ, OU MORRERÁ SEM SABER O QUE LHE ATINGIU!

Um medo incondicional tomou conta do Cavaleiro de uma hora para outra. Toda a coragem que ele tinha para enfrentar a bruxa se foi em um segundo com aquela voz fina e tenebrosa.

- Sabia que você não seria tão corajoso.

O Cavaleiro ficou pensando se o medo não teria sido provocado por uma magia. Com esse pensamento, ele deu mais um passo em direção à criatura.

- Você deve morrer! – esbravejou o Cavaleiro.

- Você diz que devo morrer, quando eu sou apenas mais uma das pessoas que você jurou proteger. Uma cidadã do reino.

- Você não é uma cidadã. Você mata crianças – o Cavaleiro deu mais um passo.

- Você ouviu falar, por algum acaso, que eu matei alguma criança? – a bruxa sorria.

- A muitos anos houve uma morte de criança.

A bruxa suspirou.

- Vocês são todos uns tolos – ela juntou alguns gravetos do lado direito e pegou uma pederneira, apontando para o Cavaleiro – Poderia acender a fogueira para mim?

O Cavaleiro olhou com despreza para a velha e cuspiu. A bruxa resmungou e jogou a pederneira pro lado.

- A tal “bruxa” que matou a criança não era eu. Existiram muitas de nós. E todas, sem exceção fomos um dia o que você jurou proteger, guerreiro. E sabe o que é engraçado. Eu sou uma figura decrépita, fraca e você não consegue fincar essa espada em mim.

- VOCÊ LANÇOU UMA DE SUAS MAGIAS EM MIM! – o Cavaleiro gritou cuspindo saliva.

- Magia... Você acha mesmo que se eu soubesse fazer magia, eu tinha deixado você chegar tão perto de mim. Você é livre para me matar a hora que quiser.

O Cavaleiro deu mais um passo.

- Se você não faz magia, me explica todas as maldades que você fez em nossas aldeias.

- O que você chama de maldade, eu chamo de sobrevivência. Sou uma rejeitada. Filha mulher de um homem que queria um menino. Depois de me ver recém-nascida, sem um pau no meio das pernas, meu pai ferveu de raiva. Por muitos anos ele me aguentou por conta de minha mãe. Quando cheguei a maioridade meu pai me expulsou de casa, e numa briga com a minha mãe, a espancou até a morte. E desde então vago por aí.

- Tive que aprender a sobreviver, mas nessa sociedade sobreviver leva um custo alto. Os rebanhos terem sumido, caro Cavaleiro, foi por eu ter esquecido a porteira da cerca aberta enquanto roubava um só animal, que os ossos você vê aqui. As doenças nas fazendas foram doenças que eu contraí ao longo dos anos, doenças malditas que só meu corpo consegue resistir. A carne das dispensas sumindo sem sinal de arrombamento foi por conta de minha agilidade, que tive que aprimorar durante os anos e só hoje consigo ser tão silenciosa. Vê as cicatrizes, foram todas por conta de me pegarem roubando – a velha mostrou marcas nos braços, barriga e cabeça.

O Cavaleiro tentava não acreditar no que ela dizia. Ele deu mais um passo e agora estava rente a mulher. Levantou a espada pronto para mata-la.

- E as crianças que sumiam... As que voltavam logo eram as que ficavam jogando pedras em mim, me xingando e me batendo. Já a garotinha que ficou desaparecida, foi uma linda menininha que ficou triste ao ver o meu estado. Era o rosto mais meigo que eu já vi, e a segunda pessoa que me olhava sem ser com medo ou ódio em minha vida. Ela queria que eu fosse para a casa dela para que seus pais cuidassem de mim, mas eu disse que era perigoso. Depois de muita insistência eu fiz ela ir embora.

- Agora entende, Cavaleiro.

O homem deixou a espada cair da mão, e se ajoelhou. Lagrimas escorriam de seus olhos.

- Eu... eu acho que sim – ele levou a mão ao rosto da mulher – Pobre garota.

A velha sorriu.


- Não chore. Entenda Cavaleiro, que eu sou só mais um fruto de sua sociedade.



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